“Dia Nacional da Visibilidade Lésbica” – casos de violência contra LGBTQ+ crescem 19,8% entre 2017 e 2018

16:48 | 29 de agosto de 2020

O dia 29 de agosto é reconhecido como o “Dia Nacional da Visibilidade Lésbica”, data criada em 1996, durante o 1° Seminário Nacional de Lésbicas, realizado no Rio de Janeiro/RJ, com o tema: Visibilidade, Saúde e Organização. Apesar da luta ter começado muito antes, esse dia é um marco na resistência da mulher lésbica por seu reconhecimento, por direitos, por posicionamento na sociedade e contra todo tipo de violência, como a lesbofobia, a misoginia e o machismo, entre outros tipos de opressão. O mês de agosto todo é hoje considerado de visibilidade lésbica, já que o dia 19 é o “Dia Nacional do Orgulho Lésbico”.

De acordo com o estudo anual “Atlas da Violência 2020”, divulgado nesta quinta-feira (27/08), uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil. No período de um ano, entre 2017 e 2018, a pesquisa mostra que os crimes de violência contra as pessoas LGBTQ+ cresceram 19,8%, totalizando 9,2 mil casos registrados no período. Desses registros, 1.800 foram casos de violência psicológica (7,4% a mais do que em 2017); 5.000 são relativos à violência física (aumento de 10,9%); e 2.100 casos classificados como “outro tipo de violência” (crescimento de 76,8%). O levantamento é realizado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

Carolina Sá Espinola

Para Carolina Sá Espinola, arqueóloga do departamento de Arqueologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a sociedade ainda é extremamente LGBTfóbica. “Vivemos em tempos muito estranhos, onde temos mais visibilidade na mídia, quebra de estereótipos, mais pessoas de influência se assumindo e levantando a bandeira e, ao mesmo tempo, um governo e população ultraconservadora e LGBTfóbica. É um retrocesso endossar atos e o discurso de ódio. Isso leva as pessoas a acreditarem que podem agredir verbal e fisicamente qualquer pessoa que não faça parte de um padrão que supostamente deve ser seguido”, analisa.

Segundo Carolina, as mulheres, lésbicas ou não, são constantemente agredidas, subjugadas e desacreditadas. “O fato de ser mulher lésbica apenas potencializa um machismo – vindo de homens e de mulheres – que nós mulheres enfrentamos desde que nascemos. E acredito que é exatamente essa masculinidade frágil que faz com que, infelizmente, a gente veja tantas notícias de mulheres lésbicas sendo agredidas no meio da rua, muitas vezes por apenas estarem de mãos dadas. Eu não consigo compreender, mas imagino que tem que existir um nível de insegurança muito alto para que um homem tente reafirmar sua masculinidade por meio da violência, física ou verbal”, destaca.

Carolina avalia que é preciso evoluir muito no Brasil, principalmente em sentimentos como respeito e empatia. “A comunidade LGBTQ+ não está procurando converter fiéis para a sua causa. Está apenas querendo viver sua vida sem medo e com direitos iguais. Poder sair na rua sem ser importunado, poder andar de mãos dadas com quem se ama, sem correr o risco de ser espancada e ter os mesmos direitos como qualquer outro cidadão que paga seus impostos”.

Izabel Gogone

A técnica de laboratório da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), Izabel Godone, afirma que a invisibilização da mulher lésbica é a expressão mais comum da lesbofobia. “Mulheres lésbicas são tratadas como inexistentes e incomodam na medida em que se expressam mais. É um ato político você se colocar como mulher lésbica”. Ela lembra que uma outra forma de violência é a fetichização. – homens que expressam desejo por mulheres que amam mulheres. “Na minha opinião esse é um sentimento perturbado, como se nossos corpos fossem objeto de prazer, mesmo que não estejamos interessadas. Ainda há o estupro corretivo e agressões como: É lésbica porque foi mal comida. É tão bonita, por que lésbica?”, reforça.

Para Izabel, o dia 29 de agosto representa o levante do debate sobre a mulher lésbica, enquanto membro da comunidade queer, que sofre opressões muito específicas. “Uma mulher negra, trans e lésbica vai passar por um acúmulo de opressões. O que dizer de um país que matou Marielle Franco e não temos respostas até hoje?”, questiona. Izabel também concorda que o discurso machista do presidente empoderou pessoas homofóbicas. “Não vou te estuprar porque não merece, ele disse isso. O medo cresceu na época da posse, parei de andar com minha namorada de mãos dadas porque tinha medo. Isso diminuiu com o tempo, mas em termos de política pública estamos indo ladeira abaixo”, analisa.

Izabel Cristina Firmino

A técnica de Enfermagem do Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP), da Universidade Federal Fluminense (UFF), coordenadora do SINTUFF (Sindicato dos Trabalhadores em Educação da UFF) e coordenadora da FASUBRA, Izabel Cristina Firmino, trabalha há 37 anos militando na saúde e em defesa do Sistema Único de Saúde (SUS). Izabel participa de várias frentes de militância. “Sou negra, da área da saúde, sindicalista e lésbica. Este ano por conta da pandemia tenho me dedicado mais a área da saúde. Mas esse dia é muito importante e foi escolhido para representar a data de combate à lesbofobia”.

Izabel também reforça que a mulher lésbica sempre foi invisibilizada, no sentido de gênero, e é mostrada como se fosse um objeto, dentro de uma estrutura machista. “É como se nós não existíssemos. Antes não tinha a letra L da sigla, então éramos invisíveis dentro do próprio movimento. Com o governo Bolsonaro, a situação piorou para os LGBTQ+ por ser um governo ditatorial, fascista, excludente, homofóbico e racista. A luta acaba ficando mais difícil”, opina.

Izabel lembrou ainda que não há uma política de saúde e um tratamento específico para as mulheres lésbicas, existe o preconceito no mundo do trabalho, sendo que muitas acabam indo para a informalidade, e também as dificuldades para ingressar no mundo acadêmico, pois muitas são expulsas de casa. “Às vezes, essas mulheres sofrem tanto preconceito, que acabam por praticá-lo e quando se trata da mulher negra, esse preconceito é triplicado. Muito há que se caminhar, são situações que precisam de muita resistência, de avanços, de expressão e de construção de espaços. Portanto, o nível de suicídio de mulheres lésbicas é bastante elevado”, pondera.

Neste dia, a FASUBRA Sindical reforça a importância da visibilidade da mulher lésbica, a necessidade de seguir resistindo e de não retroceder nas conquistas, de se ocupar todos os espaços na sociedade, na luta por direitos e contra todas as formas de violência e opressão, independentemente de orientação sexual.

Não à lesbofobia!

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