Dia da Visibilidade Trans: respeito e direito à vida
O dia 29 de janeiro celebra a importância da diversidade e o respeito ao Movimento Trans. O Dia da Visibilidade Trans é comemorado há 15 anos, desde 2004, e tem o objetivo de chamar atenção para as graves violações de direitos humanos da população trans e de travestis no Brasil. Mas não há o que comemorar. O Brasil continua sendo o país que mais assassina pessoas travestis, pessoas trans e não-binárias no mundo. Para a técnica-administrativa em educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a travesti Geovana Borges “é uma data simbólica para a nossa população, contudo ainda há muito a garantir, como por exemplo um direito fundamental que é a vida”, destaca.
Geovana confirma que o índice de violência contra os transexuais e as travestis aumenta a cada dia. “Desde o golpe de 2016, com a ascensão do governo ilegítimo de Michel Temer, começaram os ataques mais nocivos à comunidade LGBTI, principalmente no que diz respeito às pessoas transexuais e as travestis. A exclusão, da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), de redação que garantia abordagem sobre orientação sexual e identidade de gênero, foi algo que minou a possibilidade de reduzirmos substancialmente as violências contra as mulheres e a comunidade LGBTI, por meio da informação e do conhecimento. Com a proximidade das eleições e o aumento da disseminação massiva de mensagens mentirosas (fake news), depreciativas e odiosas contra nós, as agressões vêm aumentando. Durante o período eleitoral, travestis foram mortas aos gritos de “Bolsonaro”, cabeça de chapa que representa a ala ultraconservadora vencedora de um pleito presidencial regado a mentiras e ódio, encoberto por uma capa moralista financiada por grupos religiosos hegemônicos”, relata.
Como exemplo do aumento da violência, a técnica-administrativa lembra ainda da recente desistência em tomar posse como deputado federal do congressista assumidamente gay e defensor implacável da pauta LGBTI no Congresso Nacional, Jean Willys, devido às ameaças que vinha sofrendo, inclusive de morte. “E o pior: o presidente eleito comemorou publicamente, via redes sociais. Seu discurso contra a falaciosa ‘ideologia de gênero’, além de legitimar os atos de violência contra nós, afasta dessa população o apoio do Estado para uma comunidade já tão à margem da sociedade, que tem acesso a direitos negados constantemente, quando não são executadas de forma brutal e hedionda”, lamenta.
Na opinião de Geovana Borges, o efeito catastrófico das mensagens falsas contra a população trans só aumentou o estigma social de marginalização e o aumento de assassinatos. “Respaldados por uma ala de setores religiosos que os demonizam, ocorrem as ‘eliminações dos demônios’, como aconteceu recentemente em São Paulo, onde uma travesti foi morta e teve seu coração arrancado pelo seu assassino que dizia que era um demônio”.
Para a técnica-administrativa, a única saída é pela educação. “Devemos abordar essas questões na educação básica, dessa forma aproximamos as pessoas do debate e preparamos para o convívio social com a diversidade inerente à natureza humana, reduzindo as agressões por intolerância”, analisa.
A ativista Viviana de Paula Corrêa, técnica-administrativa em educação pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), que atua no Departamento de Direitos Humanos e Cidadania e representa a universidade no Conselho Estadual de Políticas Públicas para LGBTI, também reconheceu que a mortalidade da população trans no país é extremamente alta e é um desafio que precisa ser superado com o reforço das lutas. Ela, no entanto, comemorou a aprovação pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em março de 2018, da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275, que permite alteração de nome e gênero no registro civil diretamente no cartório, sem a necessidade de cirurgia. “Foi uma vitória”, assegurou.
Viviana falou sobre os desafios para o ano de 2019. “Certamente temos muitos ainda, como a nossa inclusão no mercado de trabalho, por exemplo, a nossa exclusão da família e da educação. Entendo que em 2019 nós precisamos nos unir, as pautas identitárias de uma maneira geral precisam estar unidas. A pauta trans precisa ser abraçada pelos outros movimentos identitários, não podemos lutar sozinhos. O feminismo, o LGBTI precisa abraçar porque às vezes isso não acontece. Essa é uma necessidade urgente”, disse.
Augusto Batista Baêta das Neves, pessoa não-binária e técnico-administrativo em educação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), explica que a data surgiu quando, em 2004, um grupo de pessoas trans adentrou o Congresso Nacional, pela primeira vez, para participar do lançamento de uma política do governo em prol dessa população. “Já faz 15 anos e ainda temos muito a conquistar. Os dispositivos legais de garantia de direitos de que as pessoas trans dispõem ainda encontram grande resistência na ignorância e no conservadorismo da sociedade brasileira, fazendo com que essas pessoas não consigam acesso adequado a serviços públicos de saúde e de educação, dentre outros. A sociedade se recusa a enxergar e aceitar a existência de mulheres trans, homens trans, travestis e pessoas trans não-binárias. Devemos lembrar sempre que a luta pela causa transgênero nada mais é que uma luta por respeito, por dignidade e por direitos humanos. Respeitemos sempre aos outros exatamente como desejamos ser respeitados”, afirma Neves.
Violência
No ano de 2018, ocorreram 163 assassinatos de pessoas trans, sendo 158 travestis e mulheres transexuais, 4 homens trans e 1 pessoa não-binária, segundo levantamento da Associação Nacional de travestis e transexuais (Antra). O Rio de Janeiro foi o estado que mais matou a população trans em 2018, com 16 assassinatos. Em segundo a Bahia, com 15 casos, em terceiro São Paulo com 14 casos, em quarto lugar o Ceará, com 13 assassinatos e ocupando a quinta posição, o Pará com 10.
Homenagem
Nesta terça-feira (29), o Google fez uma homenagem em sua página inicial a Brenda Lee, a militante transexual brasileira dos direitos LGBTI que foi considerada o ‘anjo da guarda das travestis’ por ajudar a todos, doentes ou não, que eram discriminados pela sociedade. Seu trabalho se tornou referencial e até hoje a Casa de Apoio Brenda Lee, criada em 1988, abriga pessoas homossexuais e portadores de HIV rejeitados por parentes. Em 1996, Brenda foi brutalmente assassinada com dois tiros e seu corpo foi encontrado dentro de uma Kombi em um terreno baldio.
Atividades
Em todos os estados e no DF, várias ações organizadas por diversas entidades são realizadas como promoção do respeito e cidadania neste dia. Em Brasília, entidades como a Organização das Nações Unidas (ONU), o Ministério da Mulher e Direitos Humanos, a Universidade de Brasília (UnB) e a Defensoria Pública irão se reunir para debater o reconhecimento de direitos e a afirmação da cidadania para a população. A programação será de 15 dias e conta ainda com as seguintes atividades: 29/01- “Ato de Rua “Nossa ideologia é o respeito”, de 9h às 20h, na Rodoviária do Plano Piloto; 30/01- Ato contra a transfobia “Se plantarmos respeito, colheremos mais amor”, das 10h às 12h, no Parque da Cidade, estacionamento 11; 30/01-Transcidadania, na SCN Quadra 01, das 15h às 18h; 31/01- Ato em defesa do Ambulatório Trans, na 508/509 Sul, às 13h30; 01/02- Ato “Somos Nós a Resistência!”, no CREAS /SGAS II St. de Grandes Áreas Sul 615, das 14h às 18h; 02/02: Curso “Desconstruindo Preconceitos”, no CEU das Artes / QNM 28 da Ceilândia, das 9h30 às 12h; 02/02- Sarau da Visibilidade Trans, na Casa de Cultura da América Latina/UnB SCS quadra 04, às 15h; 05/02- III Solenidade em Homenagem às Pessoas Trans, no Salão Nobre do Palácio do Buriti, das 14h30 às 17h; 07/02- Conferência Livre da Cidade – Temática População T, no Auditório do MDH / Ed. Parque da Cidade Corporate SHCS Q. 6 BL A, às 13h e 08/02- Audiência Pública “Direitos da População Trans/Travesti e Combate à Transfobia”, organizada pelo deputado distrital Fábio Felix (PSOL), na Sala das Comissões / Câmara Legislativa do Distrito Federal, às 14h.
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